22 de jun. de 2007

Água-cor



Água-cor

O País da cor é líquido
E revela-se
Na anilina dos vasos da farmácia.
Basta olhar, e flutuo sobre o verde
Não verde-mata, o verde-além-do verde.

E o azul é uma enseada
Na redoma.
Quizera nascer lá; estou nascendo.
Varo a lágrima de ouro do amarelo.
A cor é existente; o mais é falácia.


Carlos Drummond de Andrade.


fotomontagem: Jugioli

18 de jun. de 2007

O Lugar da casa


O lugar da Casa

Uma casa que fosse um areal
Deserto, que nem casa fosse;
Só um lugar
Onde o lume foi acesso, e à sua roda
Se sentou a alegria; e aqueceu
As mãos, e partiu porque
Tinha um destino:
Crescer como árvore,
Resistir ao vento,
Ao rigor da invernia.
A certa manhã sentir os passos de abril
Ou ,quem sabe?, a floração dos ramos,
E de novo estremecem
Com o repentino canto da cotovia.

(Eugênio de Andrade)


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15 de jun. de 2007

Bactérias poéticas


Augusto dos Anjos

A um gérmen
Começaste a existir, geléia crua,
E hás de crescer, no teu silêncio, tanto
Que, é natural, ainda algum dia, o pranto
Das tuas concreções plásmicas flua!

A água, em conjugação com a terra nua,
Vence o granito, deprimindo-o ...
O espanto
Convulsiona os espíritos, e, entanto,
Teu desenvolvimento continua!
Antes, geléia humana, não progridas
E em retrogradações indefinidas,
Volvas à antiga inexistência calma!...
Antes o Nada, oh! gérmen, que ainda haveres
De atingir, como o gérmen de outros seres,
Ao supremo infortúnio de ser alma!


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